“Quais as características dos alimentos saudáveis? A cor (quanto mais coloridos, melhor), a origem (quanto mais orgânicos, melhor), a natureza (vegetais são mais saudáveis), a produção (saudáveis se não tiverem açúcares, gorduras, sal adicionados e conservantes)”, alega-se num tweet, partilhado no dia 10 de Março.
Os alimentos biológicos (ou orgânicos) são produzidos através de um método de produção que utiliza substâncias e processos naturais. Partindo deste pressuposto, acredita-se de forma generalizada que estes alimentos são mais saudáveis do que os convencionais. Mas é mesmo verdade ou não passa de um mito?
Primeiro é importante perceber o que diferencia os alimentos biológicos dos convencionais. A nutricionista Ana Helena Pinto define os produtos orgânicos como “alimentos certificados, ou seja, cujo processo de produção cumpre os princípios definidos e controlados por uma entidade externa, neste caso, como sendo em modo de produção biológico”. Além disso, a especialista aponta que os alimentos devem cumprir “práticas ambientais promotoras da biodiversidade, da preservação dos recursos naturais e, no caso dos produtos de origem animal, da promoção do bem-estar animal. Logo, são alimentos cujo processo de produção procura provocar o menor impacto ambiental possível, nomeadamente no que à exclusão/minimização da utilização de adubos, fertilizantes, pesticidas e outros produtos fitofarmacêuticos, diz respeito”.
Os alimentos [biológicos] devem cumprir “práticas ambientais promotoras da biodiversidade, da preservação dos recursos naturais e, no caso dos produtos de origem animal, da promoção do bem-estar animal”.
O que difere os alimentos orgânicos dos convencionais é a certificação. A nutricionista explica ao Viral que escolher um alimento orgânico “é escolher um alimento certificado no que ao impacto ambiental da sua produção diz respeito, em detrimento de outro tipo de certificação (como os relativos aos pagamentos justos, aos materiais utilizados nas embalagens, ou outros) ou sem certificação”.
Estes alimentos apresentam uma vantagem nutricional?
Vitor Hugo Teixeira, professor da Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto (FCNAUP) garante que, do ponto de vista nutricional, não vemos grandes diferenças. Por exemplo, explica o especialista, “o leite de vacas que pastam tem mais 50% de ómega 3, mas o leite continua a ser pobre em ómega 3”. Noutra vertente, “se uma pessoa ganhar 50 euros por mês e eu disser que vou triplicar, o salário continua a ser baixo. Muitas vezes engana-se o consumidor assim”.
Ana Helena Pinto partilha da mesma opinião. “Não têm necessariamente mais nutrientes. Depende de que perfil nutricional compararmos. A diferença de macronutrientes não é significativa. A diferença estará no perfil mineralógico, mas que também este, dependente de outros factores”, esclarece.
“O leite de vacas que pastam tem mais 50% de ómega 3, mas o leite continua a ser pobre em ómega 3”. Noutra vertente, “se uma pessoa ganhar 50 euros por mês e eu disser que vou triplicar, o salário continua a ser baixo. Muitas vezes engana-se o consumidor assim”.
Além de ser necessário termos em conta o valor nutricional dos alimentos, Vitor Hugo Teixeira faz referência a outros dois: o domínio toxicológico e o domínio microbiológico. O professor da FCNAUP refere que a diferença significativa que se encontra entre os alimentos biológicos e os convencionais é no nível de pesticidas. “Primeiro – uma coisa que a maior parte das pessoas não sabe – pode-se usar pesticidas nos orgânicos. Os pesticidas não são exactamente os mesmos e os volumes também não, mas podem ser usados. Quando fazemos uma análise, o número de pesticidas é maior nos não orgânicos do que nos orgânicos”, aponta.
A questão é: Isso é um perigo para a saúde? Segundo Vítor Hugo Teixeira, “não, porque os valores encontrados são baixos. É possível encontrar, mas isso não chega para oferecer risco”. No entanto, quando os alimentos apresentam valores mais baixos de pesticidas, “parece aumentar o risco microbiológico. O especialista dá como exemplo o surto que houve na Europa, causado pela bactéria enterohemorrágica Escherichia coli (E.coli), em 2011, ligado a rebentos de feno-grego orgânicos. “Presume-se que a menor utilização de pesticidas depois também aumente o risco de contaminação por bactérias, porque na verdade não vai haver pesticidas para as matar”, explica.
“Não conseguimos isolar o efeito dos alimentos orgânicos”
Vitor Hugo Teixeira esclarece que, de facto, quando comparamos as pessoas que consomem mais alimentos orgânicos com as que consomem menos, habitualmente as primeiras têm menos doenças. No entanto, também se nota que as pessoas que comem mais alimentos biológicos “consomem mais peixe, mais fruta, mas vegetais, menos alimentos processados, menos sal, fazem mais desporto e ganham mais dinheiro”.
“Estamos a dizer que é melhor, mas que não há para todos. Então isto cria uma elite do consumo? Só pode ser saudável quem pode comprar e quem não pode não é saudável? O que se está a fazer é induzir a ideia no consumidor de que os outros [alimentos convencionais] têm menos valias ou não prestam, o que não é verdade”.
“E, então, qual destes factores é que contribuiu para melhorar a saúde? Não conseguimos isolar o efeito dos alimentos orgânicos. É um conjunto de factores e, em última análise, pode dever-se tudo aos alimentos orgânicos ou nada. Quem faz mais desporto por acaso também come mais orgânicos, mas todo o benefício vem do desporto. Portanto, neste momento o que é que podemos dizer? Que há algumas associações entre quem consome mais orgânicos ter mais índice de saúde, mas também há outros factores que promovem a saúde”, explica.
Depois há o factor económico: “Não há solo no mundo inteiro, nem oceanos no mundo inteiro para produzir alimentos só de forma orgânica”, refere Vitor Teixeira. “Estamos a dizer que é melhor, mas que não há para todos. Então isto cria uma elite do consumo? Só pode ser saudável quem pode comprar e quem não pode não é saudável? O que se está a fazer é induzir a ideia no consumidor de que os outros [alimentos convencionais] têm menos valias ou não prestam, o que não é verdade”.
Assim, o professor da FCNAUP conclui que realmente está comprovado que o consumo de produtos vegetais, sejam orgânicos ou não, reduz o risco de doenças. Mas esses estudos que são feitos no mundo inteiro não diferenciam entre alimentos orgânicos e convencionais.
“O que se sabe é que quanto mais vegetais, mais saúde. Se me dissesse assim: se fossem muitos vegetais e ainda por cima orgânicos, não era um bocadinho melhor? Talvez, mas quanto? Um por cento ou dois por cento? Se eles [orgânicos] custam o dobro do dinheiro: 400g convencionais ou 200g orgânicos, para gastar o mesmo dinheiro, qual é o mais saudável? Eu diria que a quantidade é mais saudável”.
Créditos do Artigo: Viral Check
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