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Movimento Reserva e Aparece chama a atenção dos clientes sobre "no shows"

Fazer reserva e não aparecer é cada vez mais recorrente e os restaurantes tentam combatê-lo com novo movimento. Os chefs Vasco Coelho Santos e André Lança Cordeiro falam sobre "Reserva e Aparece".

O colosso do “no show” — termo usado no meio da restauração para quem marca e não cumpre a reserva — não é novo, mas tem vindo a agravar-se e são os restaurantes que sofrem as consequências. Vai daí que nasce esta semana o “Reserva e Aparece”, um movimento de consciencialização que parte do sector — de chefs, sommeliers e restauradores — e que quer incentivar os clientes a mudarem a sua atitude no caso de reservarem e não poderem comparecer, até porque “os planos mudam, não faz mal, basta avisar.”


É um fenómeno que actua pela negativa e que é um balde de água fria para quem tem as portas abertas, sobretudo depois de ter sido obrigado a fechá-las por vários meses de confinamento. Para os restaurantes, uma reserva não cancelada — ou mesmo cancelada tardiamente — significa uma mesa que não é ocupada e que acaba por não poder ser ocupada tardiamente por outros clientes que já não conseguiram esse lugar à mesa. Mas um no show é também uma refeição que é contabilizada na cozinha e não é paga, o que afecta directamente as receitas do espaço e significa, muitas vezes, produto que pode ser desperdiçado, por mais tentativas que se façam em contrário.


Ao movimento aderiram já, oficialmente, vários chefs e figuras ligadas à gastronomia, como é o caso de André Lança Cordeiro (Essencial), António Galapito (Prado), Bruno Caseiro (Cavalariça), João Rodrigues (Feitoria), Lara Espírito Santo (Sem), Rui Silvestre (Vistas) ou Vasco Coelho Santos (Euskalduna). Com o poder da partilha, o manifesto tem-se espalhado organicamente, sendo esse o objectivo primeiro: o de alertar as pessoas para as consequências deste tipo de comportamentos.


Nos vários testemunhos dados para o arranque deste movimento que funciona, para já, através da hashtag #RESERVAEAPARECE, Hugo Brito, do restaurante Boi Cavalo, afirma que “o ‘no show’ é um roubo” e que se tornou numa “ameaça real à viabilidade dos restaurantes”. Também António Galapito, do Prado, faz saber que quando um cliente faz uma reserva “tem uma responsabilidade para com esse restaurante, com as pessoas que nele trabalham, com os fornecedores e produtores” e com toda uma cadeia que fica afectada caso não compareça.


“Esta situação começa a tornar-se insustentável”

Vasco Coelho Santos, chef do Euskalduna e do Semea no Porto, explica que a situação é “surreal” e se torna “muito dura” depois de meses de confinamento que obrigaram os restaurantes a fechar. “Esta situação começa a tornar-se insustentável… se isto acontece ao Sábado, e se por acaso fechas ao Domingo e à Segunda, a comida que tiveste de preparar e que ninguém apareceu para a comer, o que é que fazes com ela?”, atira o chef em conversa com o Observador.


“Às 21h de um Sábado, quem é que anda por Lisboa ou pelo Porto sem reserva? É muito raro conseguires sentar gente a essa hora, quando percebes que a tua reserva não apareceu ou cancelou em cima. É difícil porque as pessoas fazem reservas com mais antecedência — e provavelmente já nem ligam porque assumem que vai estar cheio”, confessa Vasco Coelho Santos.


No Euskalduna, Vasco não sofre com este “flagelo”, como lhe chama, porque tem uma política de reservas distinta, uma vez que reservas acima das quatro pessoas obriga a uma transferência de parte do valor da refeição “e isso faz com que as pessoas assumam um compromisso”. Para o chef, este sistema pode funcionar em alguns restaurantes, até de ticket mais baixo, onde assume ser necessário tomar “medidas concretas” ajustadas aos espaços.


Todos os dias, Vasco recebe do seu gerente o número de no shows para ir medindo as perdas em cada um dos seus espaços. “Só ontem foram três mesas de dois, são seis pessoas, eu sento uma média de 40, por isso estamos sempre a falar numa média de 12% a 14%. Não sei o que as pessoas sonham, mas um restaurante não tem mais do que 15% de lucro, por isso o lucro já lá vai, ficas com perdas enormes”, diz.


Mas há situações piores que acontecem quando “são sobretudo reservas de duas pessoas que marcam em dois ou três restaurantes diferentes e escolhem na hora a qual querem ir, e ou não cancelam, ou cancelam a meia hora da marcação”, explica.


Também André Lança Cordeiro, chef do Essencial em Lisboa, aponta o mesmo problema. “Agradeço que as pessoas liguem e expliquem e, entre os cancelamentos, há realmente imprevistos, mas há outras coisas que não se explicam. Há pessoas que marcaram três ou quatro restaurantes e em cima da hora decidem a qual vão. Não percebem mesmo o impacto que tem em nós”, lamenta ao Observador.


Para o Essencial, os no shows e cancelamentos de última hora representam entre 10% a 15% da ocupação do espaço, “o que se reflecte directamente na facturação do restaurante, claro”, diz.


Mas André refere que este fenómeno é mais do que o dinheiro que poderia ter entrado, já ultrapassa esse espectro. “Não é só uma questão de facturação, é também de produto que é comprado e trabalhado, é a decepção que causamos às pessoas a quem recusamos mesas constantemente, passamos os dias a recusar mesas que poderíamos não recusar”, conta dizendo que esta é uma prática que se acentua sobretudo aos fins-de-semana. Só no fim-de-semana passado, teve oito no shows, num restaurante onde senta 22 a 24 pessoas, “tem um impacto enorme, mesmo com a rotatividade de mesas.”


“Isto sempre existiu, mas a pandemia já foi um arrombo para nós, a recuperação da pandemia com as restrições que houve está a ser muito lenta e depois ainda temos estas situações que dificultam muito o nosso trabalho”, confessa André. “O peso na mochila começa a ser demasiado grande e as pessoas têm de tomar algumas medidas.”


No seu caso, as reservas online vão passar a ser feitas com cartão de crédito, porque “as pessoas que o fazem assumem um compromisso, não é só mais uma reserva que estão a fazer porque sim”, explica a decisão. O chef tem noção que esta não é uma solução aplicável a todos os espaços e que cada um tem de pensar qual será o caminho mais correcto, mas que “é preciso fazer alguma coisa”, diz.


“Este movimento é uma primeira consciencialização, mas as coisas só mudam quando os restaurantes agirem como fazem os lá de fora”, aponta. “O objectivo do Reserva e Aparece não é fazer shaming a ninguém, nem isso é produtivo. É antes um incentivo pela positiva, aproveitem as marcações que fazem, usufruam delas.”


No manifesto divulgado pelo Instagram, os envolvidos pedem para ajudar a manter “os restaurantes vivos”, lê-se. “Caso não nos possam visitar, avisem-nos e cancelem a reserva. A civilidade faz-se de gestos simples, que permitirão à restauração garantir um futuro mais sustentável, tanto no plano agroalimentar como também no plano económico e humano.”


Créditos da Notícia: Observador


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